bem brasil
bem brasil
Postado em: 24/10/2023 - 08:44 Última atualização: 24/10/2023
...

O sofrimento do varejo

Silvio Gonçalves de Souza – economista com pós-graduação em gestão e consultor empresarial

O Brasil deve crescer próximo de 3% em 2023. O Banco Central (Bacen), no final de setembro, melhorou sua estimativa de crescimento para a economia brasileira em 2023 para 2,9%, contra os 2,0% estimados em junho. O Ministério da Fazenda divulgou neste mês que espera um crescimento de 3,2%. A evolução da atividade econômica vem surpreendendo positivamente, como consequência de um desempenho mais robusto do setor agropecuário no primeiro trimestre, acompanhado de dados melhores dos setores de serviços e indústria no segundo trimestre.

O setor de varejo como um todo, recuou 0,2% em agosto com relação a julho, segundo levantamentos do Bacen, que divulgou o Índice de Atividade Econômica IBC-BR na última sexta-feira. No entanto, as vendas de alimentos e combustível cresceram 0,9%. Uma clara evidência de que o consumidor tem priorizado os gastos essenciais, que são mais sensíveis ao nível de renda, e vem adiando as compras de bens duráveis, que requerem um comprometimento maior da sua renda, por meio de endividamento com cartão de crédito e financiamentos próprios oferecidos pelos lojistas. Algo que vem provocando um verdadeiro sofrimento para os varejistas de eletroeletrônicos e móveis.

Se voltarmos nossos olhos para o desempenho da bolsa de valores, vamos constatar que o Ibovespa fechou o mês de setembro com uma pequena alta de 0,71%. Apesar desse discreto resultado positivo, algumas importantes ações que o compõem fecharam com quedas expressivas. O setor de varejo foi o destaque negativo, registrando quatro das cinco maiores baixas do período.

O Grupo Casas Bahia viu suas ações caírem 50,39%. A ocorrência de resultados negativos, posição de caixa não muito saudável e a dúvida de investidores quanto à reestruturação feita pela empresa levaram desconfiança ao mercado. Para reforçar o clima desfavorável, o seu vice-presidente comercial e de operações pediu demissão. Ele era visto como o único executivo da empresa com ampla experiência no varejo, com mais de 30 anos de atuação no setor.

O GPA, que opera a marca Pão de Açúcar, teve uma redução de 29,15% na cotação das suas ações, após uma queda de mais de 40% em agosto. As incertezas sobre a reestruturação da companhia, a rentabilidade abaixo do ideal e os resultados financeiros pressionados devido à elevada alavancagem financeira pesaram na avaliação do mercado. As altas despesas financeiras sobrepujando o potencial aumento da lucratividade da empresa, fazem com que o mercado projete um lucro líquido negativo para os próximos anos. A estrutura de custo elevada, a perda de escala e a pressão da concorrência devem tornar a vida da companhia ainda mais difícil.

As ações do Magalu (Magazine Luiza) caíram 23,19% em setembro. O cenário macroeconômico, marcado por juros altos, que mesmo após os cortes na taxa Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom) têm afetado a empresa e o varejo em geral, uma vez que deprimem a atividade econômica e tornam a concessão de crédito mais restritiva.

Se a análise dos números do Ibovespa se estender para o acumulado do terceiro trimestre, será constatado que as três gigantes varejistas sofreram perdas muito fortes. o GPA desabou 81,29%, o Grupo Casas Bahia despencou 70,7% e o Magalu caiu 51,04%.

Recentemente, o presidente do Bacen, Roberto Campos Neto, falou em "disciplinar" o parcelamento sem juros no cartão de crédito. Ele levantou a possibilidade de se criar uma tarifa para desincentivá-lo. Os protestos foram enormes por parte dos grandes bancos, das fintechs e, obviamente, pelo varejo. O parcelamento sem juros no cartão de crédito é tido, em muitos casos, como a única forma de uma família de baixa renda comprar itens de maior valor ou em situações de emergência, conforme argumentam as associações varejistas.

O fechamento de pequenas e médias empresas foi apontado como uma cruel consequência de uma decisão como essa. As empresas que mais sofreriam com o fim do parcelamento sem juros seriam as pequenas e médias, segundo avaliam representantes do varejo. Uma pesquisa do Sebrae mostra que quatro em cada dez donos de pequenos negócios usam o cartão de crédito como modalidade de financiamento. Por outro lado, o parcelamento no cartão de crédito apenas com a cobrança de juros poderia aumentar a inadimplência do consumidor, que já é elevada.

Uma outra questão levantada pelas associações de varejistas, é que os lojistas seriam forçados a financiar o cliente por conta própria, resultando em aumento de risco, em especial para os pequenos comerciantes.

Não bastasse a conjuntura econômica atual, uma outra ameaça bate à porta dos varejistas de bens duráveis: a severa estiagem na Região Norte, com a redução significativa do nível das águas dos principais rios amazônicos, com grande impacto sobre o transporte fluvial de cargas. Após registrar a pior seca em 121 anos, O Rio Negro continua baixando o seu nível, com um enorme impacto sobre o Porto de Manaus. As varejistas já estão preparadas para o Black Friday, no entanto, poderão ter o fornecimento de produtos oriundos da Zona Franca de Manaus (eletrônicos, televisores, celulares) comprometido para a maior data comercial do país, o Natal.

Silvio Gonçalves de Souza – economista com pós-graduação em gestão e consultor empresarial

silviogoncalves.cons@gmail.com                                         

linkedin.com/in/silvio-gonçalves-de-souza-497798102

https://www.instagram.com/silviogoncalves.cons/

Mais colunas de Silvio Gonçalves de Souza – Economista

Ver todas