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Postado em: 30/09/2023 - 17:38 Última atualização: 30/09/2023 - 18:13
Por: Alex Sander Xexéu - Portal Imbiara

Ancestralidade e tradição Umbandista: Os centros religiosos de Matriz Africana em Araxá

Informações apontam que existem cerca de 26 templos espíritas de Umbanda e Candomblé na cidade

Dois centros em Araxá que levam o nome de

De acordo com dados do último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) realizado em 2010 , a cidade de Araxá apresentava um número de 372 pessoas que se declararam seguir as religiões Umbanda ou do Candomblé, ambas, de Matriz Africana. Com dados não finalizados do Censo de 2022, esse número pode ser ainda maior com a exaltação das religiões e a divulgação da liberdade religiosa no Brasil. 

Em informações apuradas pela reportagem do Grupo Imbiara de Comunicação, em Araxá existem cerca de 26 centros religiosos de Matriz Africana, sejam eles das nações: Candomblé, Umbanda, Quimbanda, Omolocô e afins. 

UMBANDA EM ARAXÁ 

Sessão de orações na Tenda Espírita Pai José de Aruanda em Araxá. Foto: Alex Sander Xexéu

Para falar um pouco mais sobre a importância dessas religiões, o Grupo Imbiara conversou com duas pessoas praticantes da religião Umbanda e do Omolocô. Eles contaram um pouco sobre sua experiência com as doutrinas e sua importância na formação da religiosidade.

Jerry Andriano é pai de santo da Tenda Espírita Pai José de Aruanda, localizada no bairro Max Neumann, Zona Norte de Araxá. Ele explica que já nasceu bem próximo da religião visto que seu avô e sua avó já frequentavam a corrente de Umbanda. Jerry lembra que quando estava com sua avó, buscava raízes em matas e ouvia cantos destinados aos santos. “Lembro-me até hoje que eu saía no mato para buscar raízes, eu acompanhava os meus avós de Kombi e lembro de ouvir pontos para preto velho, para caboclos e baianos. Pontos que canto hoje no meu centro, minha relação minha veio daí, eu cresci dentro de um centro de Umbanda” explica.

O pai de santo ainda disse sobre as diferenças da Umbanda raiz e Omolocô. Entre as duas nações existem diferenças quanto às entidades (santos) a serem cultuados durante as orações. “Eu cresci na Umbanda raiz. E cultuamos muito o preto velho, os caboclos, os erês (conhecidos como meninos de angola), boiadeiros (também conhecido como preto velho carreiro), baianos e exus. No omolocô cultuamos as mesmas entidades só que porém agreguei os orixás é uma coisa maravilhosa. Os orixás são entidades de luz, alegria e emoção. Estou aprendendo mais sobre o Omolocô com meu pai de santo que é da cidade de Uberlândia. Esse culto tem uma energia diferente” disse Adriano. 

Jerry Adriano ao lado de seu filho de santo Gustavo Henrique. Foto: Alex Sander Xexéu

Jerry disse que segue a tradição e transmite esses ensinamentos da religião e para as pessoas mais próximas, quanto para os seus filhos de sangue e também para os filhos de santo. Um deles é Gustavo Henrique, um dos filhos de santo de Jerry . O jovem disse que aprende tudo para que um dia possa seguir os trabalhos no terreiro Pai José de Aruanda. “A coisa que eu mais gosto na religião é cantar os pontos, de louvar as entidades e sentir as energias boas. Eu canto para as sete linhas: preto velho, caboclo, erê, ciganos, marinheiros, baianos e orixás. Muitas pessoas julgam o livro pela capa, as pessoas devem conhecer antes de julgar a umbanda, as pessoas acham que nossa religião é uma coisa ruim” disse.

Herbert Rodrigo é médium na Centro Espírita Pai João de Aruanda em Araxá. Foto: Alex Sander Xexéu

No bairro São Geraldo em Araxá, está localizado o Centro Espírita Pai João de Aruanda. Rodrigo como é popularmente conhecido é médium e também é da religião da Umbanda desde os 16 anos. Hoje com pouco mais de 30 explica que seguiu os ensinamentos da avó. “Eu gosto muito da religião e minha vó chegou a falecer mas nós continuamos os trabalhos. Esse centro deve ter uns 38 anos, os trabalhos são feitos na segunda e na quarta, com seguimento de Umbanda e espírita. Trabalhamos com as sete linhas de caridade” disse.

Para o médium a sua espiritualidade é trabalhada constantemente e tudo que aprendeu com sua avó vai repassar para as suas futuras gerações. 

Na visão de Rodrigo as pessoas precisam “sair da caixinha” para não olhar com preconceito e discriminação as religiões de Matriz Africana. “As pessoas precisam entender o lado das pessoas, e também conhecer a umbanda em si em geral, conhecer a espiritualidade, saber que ela é viva e presente em todos os aspectos da vida das pessoas, não só dentro do centro espírita. Para Deus todos nós somos irmãos e lembrar de fazer tudo com amor com caridade independente de raça, cor ou classe financeira” explica.

Capela e religiosos na enda Espírita Pai José de Aruanda. Fotos: Alex Xexéu

INTOLERÂNCIA RELIGIOSA:

Uma pesquisa, coordenada pela Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras, ouviu representantes de 255 terreiros de todo o país. Quase a metade registrou até cinco ataques nos últimos dois anos.

Os ataques de intolerância religiosa também acontecem fora dos terreiros, quando uma pessoa é identificada como adepta de alguma religião de matriz africana na rua, na escola, no comércio, numa repartição pública ou até quando vai pedir ajuda numa delegacia para denunciar este tipo de preconceito.

68% o dos entrevistados relataram que indivíduos de suas comunidades já sofreram algum tipo de violência motivada por racismo religioso.

Raquel Leão é historiadora da Fundação Cultural Calmon Barreto em Araxá. Foto: Alex Xexéu

Raquel Leão é historiadora da Fundação Cultural Calmon Barreto em Araxá e explica algumas das razões porque a maioria da população tem “medo” de conhecer as religiões de Matriz Africana. “Falta levar ainda mais esse conhecimento para que não haja mais essa coisa que a gente chama de pré conceito, que é julgar sem saber ou conhecer o outro. Você faz um juízo e julgamento pois não faz parte da sua vivência e do seu cotidiano. Então é preciso conhecer para respeitar, o conhecimento, a cultura e a educação é a chave para saber mais sobre o segmento, o que ela cultua e sua diversidade.Formar cidadãos que respeitem a cultura do outro” disse. 

Novas leis protegem religiões no Brasil. Neste ano, duas leis federais foram sancionadas abordando questões religiosas. A 14.523/23 passou a prever pena para o racismo religioso e a Lei 14.519/2023 instituiu o dia 21 de março como Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé.

Qualquer tipo de violação da religião deve ser denunciada à Polícia pelo 190 ou Disque 100 dos direitos humanos. 

CENTRO DE REFERÊNCIA A CULTURA NEGRA EM ARAXÁ 

Centro de Referência a Cultura Negra em Araxá. Foto: Portal Imbiara

Cynthia Verçosa, presidente da Fundação Cultural Calmon Barreto e responsável pelo Centro de Referência a Cultura Negra disse que o espaço é aberto às manifestações de cultura negra na cidade. A Prefeitura não tem um mapeamento que reúne as manifestações religiosas da Matriz Africana, mas têm o espaço aberto para propostas de palestras, atividades e projetos para que sejam divulgadas para sociedade. 

“Hoje o Centro de Referência possui um memorial das pessoas negras que foram personalidades negras da cidade de Araxá. Lá são realizadas oficinas, palestras e atividades voltadas para a cultura negra. Possuímos um cadastro para que possamos conhecer quem são essas pessoas que estão nesse tipo de seguimento, precisamos construir juntos” disse Cynthia.